Juro, tô quase te esquecendo. Tirei tuas fotos dos porta-retratos, guardei tua escova de dentes no armário e joguei fora seu antialérgico. Não compro mais rosas vermelhas, para evitar lembranças. Nunca mais cheguei perto daquele banquinho onde namorávamos, nunca mais fiz cooper na orla e nem fui mais ao clube aonde íamos aos domingos, aquele mesmo clube que foi cenário do nosso primeiro beijo de amor. Apaguei nossas fotos do celular, deletei nossas conversas. Ainda não consegui doar as tuas roupas que ficaram aqui em casa, mas juro, tô quase te esquecendo.
Se não fossem as músicas que ouvíamos juntos e que ainda continuo ouvindo, aquela camisa azul bebê que você me deu e que é a minha favorita e o teu cheiro, eu já teria te esquecido. Não te procuro na internet, corto caminho para não passar na frente do teu prédio, evito ir ao cinema nas sextas-feiras e na praia aos domingos. Se não fossem os filmes que assistimos juntos passando na TV pelo menos uma vez por semana e aquele cara ainda vendendo pastel misto na minha esquina, eu já teria te esquecido. Mas juro, tô quase te esquecendo.
Excluí teu telefone da minha agenda e joguei fora os meus textos não entregues pra você. Pedi pra moça que trabalha aqui em casa nunca dizer que eu estou em casa, e pedi pra os vizinhos nunca falarem de mim, e nunca mais fiz beijinho de coco e nem estudei técnicas de massagem. Se não fosse a vontade de tomar aquele drink ''Pajuçara'' na Itynerantys e a necessidade de tomar banho ouvindo música, eu já teria te esquecido. Troquei a roupa de cama, quebrei aquela xícara, joguei fora a roupa que ficou com cheiro do hidratante de maracujá que te dei e você usava pra fazer massagem em mim, mas, juro, tô quase te esquecendo. Se não fosse o curaçau blue e o sorvete de flocos, eu já teria te esquecido. Se não fosse a praia dessa cidade, eu já teria te esquecido.
Comecei a ler pra afastar a insônia, entrei na academia, fui fazer compras no meio da semana, troquei o plano de fundo da minha área de trabalho, fiz uma limpa nas minhas pastas e alterei minhas senhas. Se não fossem as pessoas sempre me perguntando sobre você e aquele coração de argila que você fez pra mim, eu já teria te esquecido. Mas eu juro, tô quase te esquecendo. Cortei o cabelo bem baixinho, deixei a barba ficar alta, no tamanho que você não gostava, comi uma caixa inteira de bis, dancei na frente do espelho até não aguentar mais, dormi no meio da tarde, cheguei atrasado numa entrevista de emprego, quebrei meu cofrinho e planejei uma viagem. Se não fosse o fato de a carteira de estudante que pedi pra você fazer pra mim nunca ter chegado, juro, eu já teria te esquecido.
Se não fosse o fato de que muita coisa ficou sem explicação e fofocas, mentiras e inveja que nos atrapalharam, eu já teria te esquecido. Se não fossem os encontros com seu porteiro Harold toda sexta-feira de manhã no ponto de ônibus, eu já teria te esquecido. Se não fosse meu casaco ainda com o seu cheiro, eu já teria te esquecido. Se não fosse a vontade de te ver todos os dias, eu já teria te esquecido. Se não fosse o supermercado aonde íamos com frequência ainda estar lá, intacto, no mesmo lugar, e com nossos doces nas mesmas prateleiras, eu já teria te esquecido. Se não fosse o vídeo game, eu já teria te esquecido. Se não fosse o twix, eu já teria te esquecido. Se não fossem as lojas que vendem cadeiras e sofás, eu já teria te esquecido. Se não fosse o espelho quebrado, eu já teria te esquecido. Se não fosse a tua voz, eu já teria te esquecido. Se não fosse a tua risada, eu já teria te esquecido. Se não fosse você, eu já teria esquecido. Mas juro, tô quase.