domingo, 30 de dezembro de 2012

Sobre o Heroísmo Invisível



Não pratico o Bem para aparecer ou ser uma pessoa melhor. Faço as coisas longe dos olhos da vaidade porque a partir do momento que seja uma obrigação ser alguém bondoso, educado, heróico ou qualquer coisa do gênero, não serei mais eu quem o faz, mas apenas mais um produto do meio em que vivo. E, sejamos francos, não tem sido uma convivência pacífica.

Diante de tantos heróis de TV, de periódicos, os verdadeiros heróis, anônimos, são invisíveis. Apenas faço a minha parte (mesmo com todos os meus defeitos, claro!). Ao escrever isso, por desabafo, não pretendo fazer parte dos conhecidos, mas alertar aos invisíveis, como eu, que estamos juntos, fazendo o Bem acima de tudo, porque haverá sempre alguém que merece. Talvez esse alguém ainda não tenha nem nascido, mas poderá vir a um mundo um pouco mudado, preparado pelas nossas esperanças. E "esperança" não é uma espera sem sentido. É uma "pausa nos sentidos”, para que possamos agir na hora certa.

Agi. De coração tranquilo. E, mais uma vez, invisível, não fui notado. Quer saber? Eu quase me angustiei. Quase fiz o contrário do que preguei. Mas, parei. Pensei. E aqui estou. Disposto a fazer tudo de novo. Agradecido por não ter me corrompido pela ilusão da vaidade. Do gritar para os quatro cantos, quase me justificando pelo que foi feito, numa publicidade desnecessária. E me perder, mais uma vez, nas luzes de algo distorcido, mas rotulado de fama. Não apenas trevas cegam os incautos. Assim também fazem as luzes, se mal utilizadas. Que o digam motoristas, em noites de chuva forte, enfrentando os desafiantes (e irresponsáveis) faróis altos dos outros autos...

Será que só podemos fazer algo de bom para quem vale a pena? E o que é valer a pena? É não ter defeitos? Não ter vícios? Só fazer o Bem? E as pessoas que não sabem que podem valer a pena? Será que estão no mundo apenas para atrapalhar? Fazer o Mal? Lutarem contra “nossas” verdades? Reflitamos. É para isso que serve o período de fim de ano e não apenas para gastarmos bônus de férias e décimos terceiros salários. É muito mais do que consumismo. É muito mais do que já fizemos até esse momento.

Temos a chance de mudar. De sermos nós mesmos, sem ferir o outro. De sermos contra algo, mas saber explicar tal opinião. De convencer o outro sem ameaças, nem intimidação. De querer a mesma coisa, mas de forma diferente, no final das contas. Porque todo mundo só quer ser feliz. E felicidade é ficar bem, mesmo que a felicidade seja do outro. Precisamos ter paciência para que esse sentimento chegue logo, com esforço e dedicação. Porque até a chuva precisa de outros estímulos para cair. Ela simplesmente não cai do céu porque a terra merece. Se assim fosse, não haveria tanta seca em nosso país. Se fosse assim, ninguém valorizaria o que faz. E ninguém seria exemplo para ninguém. Ninguém se importaria com ninguém.

Reflita. Se isso for difícil para você, pelo menos comece preocupando-se por si mesmo. E o faça bem. Bem feito. Quem sabe, assim, as coisas melhorem, de forma invisível, tão mágico quanto um nascer do sol ou um crepúsculo (porque nem todos presenciam esse espetáculo). Veja a natureza, bem mais insistente que todos nós juntos. E somos bilhões. Seis bilhões de motivos para ela desistir. Mas ela não o faz e continua. Como cada um de nós também pode fazer. Apesar das adversidades; apesar das agressões contra ela; até pela ausência de ações a seu favor. Se o objetivo é melhorar, vamos nos empenhar. Porque se você quer, você consegue. De uma forma ou de outra. Mas é preciso acreditar. Ninguém nunca vai fazer isso por você. Cada um terá sempre algo (melhor) para fazer. Por si. E assim, segue a vida, gira o mundo, dia a dia, sem parar. E assim, sigo eu, passo a passo, lentamente, para não me cansar.

sábado, 29 de dezembro de 2012

Sobre como anda minha vida (inútil) sem você



Ligaram hoje mais cedo de alguma seguradora qualquer e perguntaram por você. Me reviraram inteiro ao pronunciar o seu nome com todas as letras e com a invasão típica de quem não sabe o que aconteceu:  ''Ela está?''. Está. Ela sempre esteve aqui, até mesmo quando não estava mais. Infelizmente, você não pode falar com ela. Não vai conseguir encontrá-la em outro horário qualquer e isso já faz algum tempo. Eu também me pego pensando se ela deu uma saída e vai voltar mais tarde. Mas nem é balela de quem quer dispensar o telemarketing persistentemente chato. É só que ela. Ela. Você não está.
Eu continuo trocando os sacos de lixo religiosamente às seis. Só cortei o cabelo porque a sua mãe passou aqui na semana passada e praticamente me obrigou a reagir. Ando comendo bem também e até comprei umas frutas pra colocar na fruteira da sala. Não espero que alguém venha me visitar, mas você queria a casa sempre aberta e apresentável. Acho que entendem a minha dor como arrogância. Como se eu nunca tivesse tido o direito de sentar um pouco, trancar os cadeados daqui de casa e ficar sozinho no escuro, sem som nenhum, até a dor ceder, até adormecer. Eles confundem a necessidade de digerir tudo com solidão. Antes fosse só solidão e umas pílulas pra dormir. Antes fosse só insônia das brabas e umas sessões de terapia pra resolver. O que eu perdi não criou trauma, nem sequela aparente. É que não dá pra fingir que nada aconteceu ou que, pior, passou. Eu não passei, meu bem.


Eu convivo com a falta. Os meus demônios me deixaram aqui depois que você me deixou aqui também. As coisas quase pararam depois daquela terça-feira ensolarada. O dia tava ótimo e dava pra gente ter pegado uma praia, matar o trabalho, fugir dos celulares e tudo o mais que a gente costumava fazer. Mas não deu. Era uma terça-feira diferente num corredor estreito com o coração mais estreito ainda na mão. Quase precisei de um desfibrilador quando os médicos vieram. A visão apagou, a audição acompanhava um ritmo constante de quem tinha acabado de desligar o que me mantinha vivo. Deitei no chão e só acordei quando já tinham tirado você de mim. Se você fosse, lembra que eu não iria aguentar ficar aqui também?
Continuo assistindo aos mesmos programas e evitando dar de cara com as suas tomografias espalhadas pelos armários da casa. Não mudei nada de lugar e nem quero jogar nada fora. O que você foi, fica. Eu não quero esquecer, eu não quero tratar de seguir em frente. Porque eu tenho certeza de que eu seria uma pessoa pior pra mim – e pra você – se eu jogasse tudo fora, pintasse as portas, limpasse as botas… Sem você a falta cresceria mais ainda e me devoraria. Me engoliria a seco. De uma vez só. Sem nem respeitar a minha dor como os outros, que pisam em ovos quando falam do seu nome. Eles não gostam de me revirar. Só querem mesmo é me expulsar de você por alguma razão benéfica que a minha razão desconhece.
É só que, por favor, não me deixa aqui sozinho. Eu prometo não pular o muro do vizinho e prometo me comportar bem. Eu paro com as piadas de mau gosto, aceito me mudar pra alguma cidadezinha de campo e tiro a barba se você quiser. Eu paro de roncar, começo a beber menos cerveja e até assisto as novelas do seu lado. Te levo pra jantar naquele cachorro-quente que você queria conhecer, te empurro de supetão na piscina e faço a massagem de todas as noites por mais tempo. Eu vou me agarrar a cada parte de você e você vai até enjoar da minha cara, ou vai rir de como eu sou bobo, ou vai bater alguma foto espontânea da gente caindo no sofá, ou vai me dar um filho e a gente vai escrever um livro muito bonito sobre como tudo isso passou e a gente passou também e… A gente não passou, meu bem.
-Posso falar com ela só um pouco?
- Pode, mas não demora. 
-Ela precisa descansar? 
-Ela não vai conseguir falar muito.
- Mas ela pode me ouvir? 
-Pode, mas não demora. 
E eu continuo me lembrando de quando o médico me deixou sozinho com você. Foram as últimas três palavras que você conseguiu pronunciar antes de arfar um pouco e da enfermeira recomendar que eu te deixasse sozinha por conta dos sedativos. Foi o último beijo na testa e a última vez em que a falta não se fazia presente. E, depois da ligação de hoje e de terem me revirado por inteiro, eu vi que do avesso eu sou inteiramente você. E que a falta é o meu choro escondido vendo algum canto perdido na cidade. Tudo ainda é sobre você. Até mesmo essa minha vida, que era pra ter sido menos ordinária se você ainda estivesse aqui.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Sobre quem prefere ser racional



Foi se esconder dele. Deu uma volta pelo mundo, conheceu mais do que queria e muito menos do que devia. Pegou sereno numas noites parisienses e torrou em temperaturas descomunais nas praias da Nova Zelândia, ambas as situações agravaram a alergia dela. Ficou de cama. Leu alguns livros. Aprendeu a falar chinês e fez um retiro de alguns meses. Ficou mais leve e bordou nomes inteiros em toalhas durante sua estadia em casa de campo. Correu sem camisa na chuva e foi repreendida. Nadou nua num lago qualquer e foi admirada secretamente por estrangeiros que não falavam a sua língua. Provou línguas que não eram as que tinha provado de costume. Se encantou com sabores – da culinária e do suor salgado de outros caras. Beijou algumas mulheres e descobriu que os toques femininos possuem uma maciez sem igual. Se espantou com o primeiro orgasmo dado por mãos gentis e menores que as suas. Pulou carnaval fora de época e resolveu tirar a fantasia pra viver quem era de verdade. Pintou o nariz de palhaço e outros o pintaram para ela sem que tivesse pedido. Andou em cordas bambas. Se desequilibrou tantas vezes e em outras tantas foi chamada de louca mesmo que tivesse conseguido se manter em pé. Cavou buracos, algumas covas e enterrou fantasmas. Chamou seus demônios interiores prum papo num café. Acabou levando alguns deles pra cama e outros pra ver um filme no sofá por falta de companhia.
Lembrou que tinha medo do escuro e quis ligar pra ele.
Acordou com a água batendo no nariz e sufocou. Aprendeu a nadar e pensou ter encontrado algum tesouro no fundo do mar só pra justificar a aventura dessa vez. Secou os cabelos quando saiu do banho e largou a toalha molhada em cima da cama. Gostava da desordem dele. Calçou os dois pés errados e descobriu que ser bobo tem seu lado bom e ruim nessa vida. Jogou algumas roupas fora depois de uns dias de corrida. Parou de encolher a barriga e conheceu a família de alguns homens bons. Não parou com nenhum deles porque nenhum deles a fazia parar. Continuou correndo. Dessa vez, não sabia pra onde. Girava o mundo e o mundo parecia fazê-la parar sempre no mesmo ponto de partida. Renovou o visto e podia ter ficado em qualquer lugar do mundo que quisesse.


Do bigode sujo e da tampa levantada. Dos assuntos monótonos e da inteligência recatada. Da barriguinha conservada de chope e do jeito que a carregava no carona da bicicleta. Da negação dele em usar carros pra salvar o meio ambiente. Gostava até dos defeitos que a fizeram ir embora e bater a porta e atravessar a rua e desligar o telefone e pegar um carro e cair no mundo e se encantar com fotografias e dar um adeus sem despedida. Gostava mais dele do que das reticências que tinha estipulado pra sua vida. Fugia porque gostava dele e de todas as coisas que havia sobre ele. E em cada lugar que ia, guardava um pouco do que ela tinha sido pra não se esquecer de quem ele era. E conseguiu esquecer-se dele. Quando se deu conta disso, entendeu o porquê de fugir tanto assim.
Ele a amava. E ela, depois de conhecer o mundo e ver de tudo e de todos, sabia que faltava algo nela. Era ele. Mas ela decidiu deixar pra lá, como fazia em todos os fins de tarde. Mesmo que isso arrancasse dela um pedaço seu todos os dias, preferiu ser ''racional'', vestiu a armadura do orgulho e seguiu sua viagem pelo mundo.
Para quem não sabe: Em tudo, tudo, tem que haver equilíbrio. Até o bem e o mal devem existir na mesma medida.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Minha Última Carta de Natal.







Dá uma olhada por trás do ombro e dá meia volta, por favor. Ô, meu bem, desde quando o orgulho vedou seus olhos? Deixa que eu te ajudo a arrumar a árvore desse ano e dos outros. Deixa que eu embalo os presentes e te embalo num abraço apertado, daqueles com começo, meio e nenhum fim. Deixa que eu brinco de ser seu amor secreto, revelado, escondido ou o que quer que seja desde que eu seja o seu amor. É só você deixar.

Deixa que eu me comporto à mesa e escolho os talheres, os destinos, as viagens e as palavras corretas. Prometo surpreender você e qualquer um que duvidar que eu possa ser capaz de tratar a sua felicidade como se fosse minha.  Deixa que eu paro de insistir e implicar com você, com as caretas, com as canetas sem tampas e com os filmes que você escolhe pro cinema. Deixa que se for pra me descompletar, eu faço isso sozinho. Com você eu sou quebra-cabeças sem solução porque venho simplificado numa peça que só você entende.

Deixa que eu não limpo as bochechas e deixo o seu beijo por lá, que é pra marcar território e levar de lembrança por onde eu for. Deixa que eu deixo a marca de alguma aliança nos dedos pra poder contar repetidas vezes a nossa história a algum conhecido que pergunte. Deixa que eu não vou mais pra longe que é pra não morrer nem matar de saudades. Deixa que eu fico pra sempre – ou venho sempre que você quiser.  Deixa que eu largo um presente de surpresa pra você abrir quando acordar. Que eu quero ver a sua carinha se encher de alegria quando vir que alguém lembrou de você na manhã de Natal.


Deixa que eu vou ser um bom menino na frente dos seus pais e quando você precisar também. Que eu ocultarei a parte ruim pra você desconhecer meus monstros, apesar de desconfiar que eles se escondem debaixo da nossa cama. Deixa que eu me mostro quando você pedir por um pouco mais de sensibilidade. Deixa que eu te dou um beijo embaixo de um visco que é pra espantar o mau olhado e conquistar você de vez. Deixa que dessa vez eu me desculpo por ter deixado você me escapar. Deixa que dessa vez o meu pedido é sincero e se reproduz nos outros trezentos e sessenta e quatro dias. Deixa que eu só vou escrever mais essa carta pra você – e espero que dessa vez você leia, e não descarte como as outras mil.
Deixa que eu resgato as tradições de todos os anos, mesmo que confunda o bom velhinho com o coelho da páscoa ou com a fada do dente. O meu pedido aqui é sempre você. Desde que algum deles te traga pra perto, eu não me importo com as superstições.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Mulher-Folhetim




O desespero é comum no meu dia a dia com ela. Ela vira de costas, e eu sei que promete a si mesma nunca mais voltar e nunca mais girar a maçaneta a meu favor. Os arranhões abertos no meu braço são a prova da visceralidade dela. Tão intensificada que não cabe na própria história e resolve invadir a minha – com pólvora, saliva e um pouco de dor. Ela não respeita a privacidade das portas fechadas. Desliza pelo banheiro como se ninguém existisse ali – nem ela mesma. Acho que ela despreza a sua própria presença e odeia a sua companhia. Mas, pra não ser mesquinha, finge conviver bem com os fantasmas da sua cabeça. É uma dessas mulheres que não cabem em si mesmas, tem manias comportadas e desejos íntimos que representam perigo a qualquer um que esteja num raio de distância inferior à raiva dela. Ninguém nunca sabe o que ela sente  e, se sente, o motivo de tanta amargura e de tanta compaixão quando mistura lágrimas ao sangue das tentativas frustradas de ir embora de vez. Se eu me corto sem querer com a lâmina de barbear, ela se corta pra conseguir algum torpor animalesco. Não sabe lidar com a falta, e muito menos com a minha ausência.Ela só se encontra nos frascos sem receituário que consegue de maneiras ilícitas. Para além dos frascos, um outro mundo de pequenas doses de sossego. Respira fundo,rasga a pele, fecha os olhos e vê o mundo que conhece se deslocar prum lugar muito distante do que ela está acostumada. É o seu jeito de encarar as coisas e de admitir que não tem solução. 
Meu bem, eu tento te proteger de você mesma. Você é uma dessas bombas-relógio prontas para explodir a qualquer momento. E eu tento, em vão, te desarmar. Tento cortar os seus fios vermelhos antes que você nos exploda por aí e acabe de vez com o que resta de duas almas saturadas pelo tempo e por essa coisa que a gente explica como obsessão. E, num ímpeto de loucura, ela some. Alguns diriam que é a parte mais consciente e coerente dela. Eu procuro em todo canto, todas as vezes, nas mesmas ruas e nos mesmos becos movimentados. As luzes da cidade se apagavam, mas eu tinha a certeza de que os olhos dela não se fechavam. Eu imaginava coisas. O escuro só representa perigo pra quem tem alguma dívida com as vozes da cabeça. Acho que nós dois somos sempre pegos na armadilha das suas fugas. Eu, entorpecido, me desoriento por aí gargalhando em altos tons e desconhecendo você em rostos e saltos e cores de batons que não são seus. As caras borradas que me olham parecem ter medo de mim. Será que você também se sente assim durante a nossa obsessão? Achei beijos que não eram seus e não pertenciam a outras mulheres-folhetins. Só que eu sempre te encontro, parada exatamente no ponto de largada, esperando colo, algumas palavras e o sono conjunto que vem pra trazer o nosso tormento de volta. No fundo, eu e você sabemos que eu não te tenho. E nem você mesma é dona de si. Você é uma dessas mulheres-folhetins do Chico. No pior sentido do termo. No extremo mais perigoso da coisa. Você nunca foi feita de estar, você é feita de ir.

sábado, 8 de dezembro de 2012

Para o amor da minha vida




De verdade, meu bem, eu não acredito que você exista. E se já comecei pensando assim, boa coisa não vai sair dessa minha carta. O fato é que eu ando meio desacreditado, achando que toda a minha vida amorosa e essas coisas que a gente pode englobar nela são todas uma fraude. Eu sou uma fraude, pra ser exato. Escrevo sobre amor, faço os outros acreditarem e nem eu mesmo acredito numa única palavra que sai da minha boca. Mas hoje eu estava pensando e cheguei à conclusão de que, se não for por amor, que seja por você.
Que eu te encontre num dia ensolarado, nublado, chuvoso, com névoa e te diga alguma coisa. Que eu te reconheça no momento exato em que puser meus olhos em você. E que você saiba que houve um encontro ali. Que você esteja vestida de vermelho, amarelo, azul, verde, preto e branco. Que você me ache engraçadinho, pelo menos. Quem sabe tímido, quem sabe babaca demais, quem sabe charmoso, quem sabe eu nem te chame a atenção. Mas que você me veja com bons olhos e eles encontrem os meus. Que você tenha cabelos pretos, ruivos, castanhos ou que tenha cabelos loiros, olhos verdes e lábios rosados, como a moça que apareceu pra mim num sonho estranho hoje de manhã. Que eu perceba cada detalhe seu. E que aí você perceba o quanto eu te enxergo em tão pouco tempo. Que você seja amiga de algum amigo, ou a gerente do banco, ou a recepcionista daquele restaurante que eu gosto, ou a colega de faculdade, ou a menina bonita da balada, ou filha da amiga da minha mãe. Que você se encante comigo de alguma maneira. Que você se permita me conhecer melhor e saber que eu sou legal, ou que sou interessante, ou que não tenho nada a acrescentar a você, ou que eu sou um completo egoísta, ou que eu tenho um blog bacana que fala dessas coisas bonitas que as pessoas acreditam. Mas que você não seja um ponto final. Que seja as aspas, as reticências, o parágrafo, o travessão. Que você seja.
Que você saiba como eu sou complicado, ou que eu sou desajeitado, ou que eu não sei dançar, ou que eu piso no seu pé porque não sei andar em linha reta, ou que eu adoro o cheiro de queijo ralado, de grama recém cortada e do mar. Mas que você decida ficar e me conhecer mais, seja por curiosidade ou porque acha que pode se encontrar no meio da minha bagunça. Que a gente se conheça aos poucos, aos muitos, aos tantos, aos beijos, aos toques, aos olhares, aos filmes de fim de tarde, aos cheiros de perfume novo, aos dias de dormir de conchinha, nas transas, aos minutos de ligações intermináveis. Que você possa contar comigo, possa dormir comigo, possa brigar comigo. Que você não se arrependa naqueles momentos em que a gente questiona o amor, que você tenha orgulho de me mostrar pras suas amigas e que elas tenham inveja de você. Que eu possa te levar café na cama, te dar um beijo de surpresa, te ver sem maquiagem, te morder até você ficar sem graça. Que você não desista de mim. Ou até desista, mas depois volte atrás. Que você entenda que posso te dar o mundo, mas que você precisará vez ou outra me mostrar que também quer me dar. Que eu não seja odiado pelos seus pais, que eles não me chamem de filho, que seu irmão torça pro mesmo time que eu. Que você me queira como pai dos seus filhos, que você se orgulhe de mim, que você esteja linda quando subir no altar.
Que eu possa te fazer sonhar. Que eu possa te ajudar a realizar os teus maiores sonhos e te consolar caso alguma coisa dê errado no meio do caminho. Que eu não saia nunca do seu lado, nem quando você pedir. Que os seus dias de TPM sejam lembrados com risadas e justifiquem aqueles quilos a mais que você ganhar com o brigadeiro. Que você chore bastante. Chore de rir, chore de saudades, chore de alegria. Que eu possa garantir que você não vai se machucar. Que o nosso filho tenha os seus olhos, a sua boca, o seu nariz e os seus sinais. Que ele me lembre todos os dias de você. Que a gente caia um pouco na rotina e não mude por isso. Que a gente saia da rotina e se encante com algumas aventuras de vez em quando. Que a gente saiba reconhecer o valor da companhia do outro. Que eu te ame como nunca amei ninguém e que você me modifique da maneira que o seu amor quiser.
Mais importante que isso tudo: que você exista. E que não demore tanto pra chegar na minha vida.

Um sonho misterioso

Eu não sou uma pessoa que sonha muito. Não quando estou dormindo. E sempre que sonho eu sonho que eu sou o mar. Sonho que entro no mar e me torno parte dele. Mas hoje tive um sonho diferente, um sonho misterioso. Eu estava de frente pro mar, como o habitual. Mas antes que eu entrasse um homem me chamou. Eu não via o rosto dele, mas consigo lembrar da voz. Ele tinha vestes brancas e uma áurea brilhante. Não sei se era um anjo, não sei se era uma mensagem de deus me cobrando por eu estar andando tão sem fé. Simplesmente não sei. Ele me disse que tinha morrido hoje de manhã e que estava livre de todas as dores. Ele me disse que logo estaria em um lugar de paz eterna, trabalhando como médico dos espíritos sofredores, mas que precisava me mostrar algumas coisas. A praia estava deserta, como sempre. Mas quando nos viramos um mundo de coisas estava acontecendo. Dois cavalos correndo na areia, dezenas de livros espalhados no chão, um divã preto, uma meia dúzia de tijolos, uma mesa de café da manhã, pássaros voando próximos aos cavalos... uma música tocava...tento lembrar qual era mas não consigo...e do meio de tudo saiu uma moça. Essa moça era quase da minha altura. Lembro dos cabelos loiros, dos olhos verdes e dos lábios dela. Ficaram bem guardados na minha mente. Mas não lembro do rosto. Apenas lembro que todo aquele movimento na praia parou por alguns segundos enquanto eu fitava os olhos dela. Como num filme, tudo voltou a se movimentar normalmente, como se nada tivesse acontecido. Ela veio em minha direção. E então o homem me falou: daqui há alguns anos os caminhos de vocês irão se cruzar. Vocês sofrerão muito até lá, irão crescer, irão aprender. Mas tudo isso levará o caminho dela até o seu e o seu até o dela. Ela então sorriu, montou em um dos cavalos e sumiu no horizonte. O homem então apoiou a mão em meu ombro e me falou que eu teria que me preparar para os anos seguintes. Que eu fosse forte, que eu não perdesse minha essência, que eu encontraria o que estava destinado pra mim. E assim, com um simples lampejo, o homem sumiu junto com todas as outras coisas. E lá estava eu novamente entrando no mar e me tornando mar, como sempre.

Sobre a realidade envolvendo mulheres e ''caras legais''



Eu sempre admirei muito aquelas garotas que davam foras diretos, do tipo que você não teria mais dúvidas do que elas sentem por você. Mas, como sortudo que sou, sempre me deparei com o tipo de garota que resolvia exaltar a pior qualidade que eu tinha em meus tempos infanto-juvenis, e talvez ainda tenha: ser um cara legal.
“Caras legais” é a raça poodle pra toda mulher. É o cara que vai ajudá-la naquela prova de álgebra linear em que ela não sabe nem somar, vai levá-la pra ver aquele filme que ninguém quis ver com ela, vai fingir que gosta de ouvir o que ela fala só porque está interessado ou, na pior das hipóteses, porque gosta dela. No final das contas, ela vai passar a mão na cabeça, deixar de lado e partir pra outra.
Parece equivocado o que eu estou dizendo, que é lógico que não é bem assim, afinal de contas, que mulher recusaria aquele cara que faz tão bem à ela desta forma? A minha resposta é: todas. Todas as mulheres vêem na espécie de cara legal um tipo de porto seguro. E nenhum porto seguro serve como primeira opção de embarque de alguém. Uma mulher necessita daquela movimentação num relacionamento, seja por necessidade de emoção, por fuga, por querer se sentir em perigo ou por puro capricho. A verdade é que ninguém quer se ancorar naquela categoria estereotipada como certinho, como previsível, como perfeito demais pra ela.
E é por isso que a maioria das garotas acaba se apaixonando por aquele sujeito todo errado da vida. Porque ele oferece exatamente o que ela precisa, em tese, num relacionamento: a sensação de imprevisibilidade. Mas, enquanto está explicado o lado feminino da questão, o “cara legal” fica parado com cara de babaca enquanto a guria dispara para ele todos os adjetivos que ela tem a seu respeito. “Mas você é especial demais para mim, eu não quero ter nada com você pra não estragar isso.” “Mas você é foda, você é perfeito pra mim, não quero que seja assim…”
E por aí, o “cara legal” se desaponta e se questiona o porquê de ser legal. Ele se questiona se há algo de errado em querer alguém bem, em não pensar em ter algo com ela e nunca mais dar as caras ou fingir que não a conhece. O grande problema da frustração do “cara legal” é que a garota deixa uma espécie de expectativa. E eu juro que vejo que algumas delas não fazem por mal. Mas sabe aquela história que eu contei sobre ele ser um porto seguro? Então, é bem isso. Se nada der certo, ela se ancora nele antes que a tempestade faça o barco naufragar. Se nada der certo, ele é o contentamento dela com uma situação que ela não pôde mudar. Se nada der certo, ele é seu plano Z.
E não as culpo por ter essa visão do “cara legal” como raça menosprezada. Não mesmo. Só acho engraçado esse longo ciclo vicioso. Porque o “cara legal”, caso resolva atender às necessidades dela se tornando um grande filho da puta, acaba por sair da categoria poodle e chega à categoria Rottweiler: perigoso demais e babaca demais pra ela. Ele se torna exatamente o oposto do que ela queria. E o guri continua achando que o problema era com ele… Coitado de quem for pagar a conta do analista mais tarde.
As mulheres, em sua maioria, são hipócritas e têm prioridades muito banais num relacionamento, ou para poder iniciar um relacionamento. A grande moral da história é que aquela máxima do clichê “Não trate como prioridade quem te trata como opção” representa um grande beco sem saída pro poodleman.  Enquanto ele fica naquela dicotomia entre não saber o que fazer e não querer perder tudo de uma vez, a garota brinca de passear com ele no bosque e depois sai pra se exibir com o Pastor Alemão do vizinho. E ela só vai saber que o cachorrinho que a acompanhava fielmente era quem realmente importava no momento em que o barco naufragar e o porto seguro não for mais seu.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Sobre sonhos e medos.




Eu tenho medo de deixar passar o tempo e não me ver nele. Tnho medo de olhar muito pra frente, ou muito pra trás, ou muito pra qualquer direção e  acabar esquecendo de me olhar no espelho, de reparar nas marcas do rosto, na espinha vermelha que não é tão aparente assim, nos contornos do nariz que vão se modificando ano após ano. Tenho um grande receio de me perder ao não saber mais dizer a cor dos meus olhos – ou pior: de não saber mais se eles ainda brilham por alguma coisa apaixonante. Sem contar com o medo de não ter rugas no coração.
As nossas motivações diárias acabam se tornando mecânicas, a gente vira script rodado de blockbuster da sessão da tarde. Somos iludidos pela premissa de que as rédeas da nossa vida são nossas de verdade. Se eu te perguntasse agora qual era a cor do céu de ontem à tarde, você não saberia me responder, mesmo que tivesse andado pela cidade o dia inteiro. Os edifícios cor de cinza ultrapassam o campo de visão, agora nós é que somos cinzas. Deveres e responsabilidades tiram o lugar especial que os sonhos tinham. E a fantasia que proporciona catarse e dá alguma razão à vida se torna um vazio sem esperança. A gente vive pra quê?
Uma das minhas grandes frustrações dos dias corridos: não vou mais a festas infantis como antes. Aquele colorido constante e as correrias de crianças foram extintos. As vozes minúsculas agora nos tiram a paciência, irritam pela inconveniência. E o que eles dizem não importa porque nós alegamos que eles não sabem o que dizem. Aquele nosso olhar marcado encara os pequeninos com superioridade. E quem me dera que essa superioridade fosse apenas por causa da diferença de altura. Mas nós acabamos por nos tornar tudo aquilo que negávamos ser: descrentes no que realmente queremos viver. E me assusta que nossos sonhos sejam tão descartáveis quanto os copos plásticos ou a decoração da mesa dessas mesmas festas infantis que paramos de frequentar.
Nós negamos a nós mesmos o direito de acreditar e aproveitar a diversão por ela mesma. A espontaneidade infantil é perda de tempo pra nós. Corredores que somos, acabamos esquecendo qual é a corrida que vale a pena. Mesmo que a corrida exija que paremos um pouco pra respirar ou que mudemos de via no meio do caminho. Meu receio é de que estejamos postergando os nossos sonhos – aqueles elementos do imaginário que são associados diretamente a nossa felicidade – e colocando ações mecânicas sem sentimento nenhum no lugar deles. A gente se esconde atrás das obrigações sociais e as utiliza como desculpas pra depois. São os nossos 5 minutinhos diários a mais. Parecem inofensivos, mas têm efeito retardado: somam-se às obrigações e fazem desaparecer as nossas vontades mais inofensivas e espontâneas. E, com isso, a tal da felicidade também vai embora.
Lembro ainda que, quando criança, eu tinha um medo danado do escuro. Era só fechar os olhos que a imaginação me fazia ver um mundo de possibilidades que variava de monstros a seres especiais de outras dimensões. Mas agora os medos se foram. E junto com o escuro, a imaginação também se foi. Sonhos não mudam, caro leitor. O que muda é a cabeça do sonhador. Aos 10, aos 20, aos 35 e aos 50. E a gente parece se esquecer disso e continuar com o campo de visão limitado num ângulo pouco menor que 90 graus. Minha dor é não conseguir mais ver além dos meus olhos – coisa que já tem acontecido há algum tempo. E nesse meio tempo, eu tenho medo de me perder dos sonhos encaixotados, da infância risonha, da espontaneidade diária e de tudo aquilo que foi feito pra fazer girar a vida. E você, meu amigo leitor, tem medo do quê?



segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Sobre a vingança




Imagine uma pessoa que fala pelas costas, engana os outros e é desleal com você. Sua primeira atitude diante da descoberta do mau caratismo dessa pessoa é tentar revidar, mostrar o quão injusto ela foi e em alguns casos passar anos remoendo aquela história numa tentativa de reaver sua paz de espírito. Honestamente, não consigo ver a utilidade em ficar brigando mentalmente com alguém que me fez mal, ainda que eu saiba que essa é a estratégia típica de nossa mente preguiçosa. Sim, preguiçosa, pois o ódio é a maneira mais preguiçosa de lidar com um mal feito sobre nós. O ressentimento é um certo estado de covardia mascarada de justiça em que nos engajamos numa luta imaginária contra um inimigo sem alma. Qual o resultado disso? Anos gastos planejando vinganças que nunca se cumprirão, ou seja, energia emocional gasta de forma inútil quando poderia estar sendo usada para amar, brincar, se divertir e seguir em frente. Toda a criatividade que você gasta no ranço psicológico “contra” aquela pessoa é como se tentasse matar alguém tomando você mesmo o veneno. A forma mais inteligente de sair de uma agressão recebida é: saia por baixo, deixe que a pessoa se sinta vitoriosa e deseje que ela saia de “sucesso” em “sucesso” afastando todas as pessoas ao redor dela. O próprio veneno emocional que ela carrega em si dará conta de fazê-la permanecer distraida do essencial da vida que é ser feliz.
Se você que recebeu algo ruim ainda ficar anos à fio engajado numa tentativa vã de retratação ou sair por cima (mostrando o quão errada e desonesta aquela pessoa foi) nada mais vai conseguir do que se ocupar de lixo mental.
Se você realmente acha que foi prejudicado não se permita perpetuar mais azedume dentro de você, se desligue dessa história e gaste toda sua energia em construir novas relações positivas. Já muita gente de coração bom se deixar envenenar e se tornar gente mesquinha e amargurada por ter alimentado um sentimento de injustiça pessoal. Com o tempo se tornaram tão destrutivas e tóxicas quanto aquela pessoa que acusavam. O amor une, mas o ódio congela você e seu agressor. Não deixe isso acontecer com você, siga em frente e só volte a olhar para trás quando já estiver suficientemente forte e feliz para isso. Com certeza irá olhar tudo aquilo com novos olhos e vai tirar belas lições sobre você mesmo. perceberá que não foi uma vítima indefesa ou tão ingênua quanto imaginou. Quanto a aquela pessoa que lhe casou mal? Deixe-a consigo mesma, o resto não é com você, mas sua própria vida sim.