Observe, todo escritor, competente ou não, encontra para si, inevitavelmente, porque uma hora há de acontecer, aquela pessoa inexplicável e ela se torna um objeto de adoração porque tem uma coisa qualquer de entidade com aspirações místicas; de personificação do que é a síntese do absurdo ou beleza da existência; do ideal dos sentimentos que gostaria de sentir profundamente e que se concretizam em linhas de delírio lascivo e desejo voraz; porque tem aquele ''quê'' da visão sublime que ele vasculha incansavelmente no mundo, remexendo em toda a merda fétida, até encontrá-la, para conseguir realizar as pequenas ações mecânicas diárias. E a imagem daqueles olhos doces e ingênuos não me saía da cabeça. A meiguice contrastava com seu tipo atrapalhado e nem tão feminino . Mas aqueles olhos doces não me saíam da cabeça. Poderia me perder por séculos no sabor deles e me tornar o senhor do tempo numa eternidade de dois segundos.
Posso começar contando como tivera sido excitante a brevidade do encontro do meu braço com o braço dela, ou sobre como fiquei involuntariamente corado, ou sobre como a desprezava, acima de tudo, como desprezava o estereótipo que ele representava, ou sobre como desprezava a mim mesmo por me sentir perturbado, ou sobre como eu desprezava a maneira que eu me comportava quando a sujeita se dirigia a mim, respondendo laconicamente como quem não se interessa, querendo enfiar meu focinho envergonhado na terra. Este sou eu, um amante ousado e descarado e, ao mesmo tempo, tão timido.
E então de que me adiantavam, portanto, o álcool, os cigarros, outras mulheres, o mundo, a puta da vida, se não tinha aqueles olhos doces? Poderia delirar sobre eles, por eles, porém nunca os teria porque, como se diz, ela era muita areia pro meu fusquinha ultrapassado. E, no entanto, ainda assim, a imagem inquietante daqueles olhos doces e ingênuos persistia na minha cabeça. Eu odiava aqueles doces olhos castanhos. Eu a odiava.
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