terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Saia de cima do muro



Detesto couve-flor, lugar cheio, tropeçar num passo de dança, frio sem agasalho, calor insuportável, trânsito agarrado, passarinho quando cai do ninho. Detesto mentira, atrasos, dieta na segunda, pizza sem ketchup, cachorro abandonado, finzinho de domingo. Eu tenho horror a um bocado de coisas, mas pânico mesmo, desses de arrepiar até o último fio de cabelo, eu tenho é de gente mal resolvida. Que não sabe se casa ou compra uma bicicleta, se vai ou se fica, se ama ou odeia, se vem ou não vem. Gente que faz da dúvida um adorno, da interrogação o término de uma sentença perfeita, da acomodação uma filosofia de vida. Gente incapaz de assumir seus saltos, mergulhos, erros e – por que não? – seus afáveis acertos. Sentar em cima do muro para muitos virou hábito e caiu no abismo insuperável da normalidade.
De fato a vida seria muito mais simples se nossas escolhas se resumissem apenas a qual sorvete tomar naquela tarde morna de verão – limão ou chocolate? Mas quando se trata de relacionamentos, projetos e estilo de vida, a toca do coelho de Alice é muito mais profunda do que o próprio país das maravilhas. Às vezes a gente prolonga uma situação, um status, um sofrimento, uma aparente felicidade, por puro e simples medo de mudar o rumo. A vista em cima do muro pode ser bem agradável para alguns, afinal de contas, de lá é possível apreciar os dois lados da história sem precisar arcar com os riscos de optar por um dos sentidos. Seria bem cômodo, até divertido, se no meio dessa indecisão toda não tivesse um monte de sentimento mal resolvido e uma porção de gente lá embaixo ansiando pelo salto ou pela queda e, de certa forma, dependendo da sua escolha.
Pior do que ser marionete dos nossos próprios receios é ser brinquedo da indecisão do outro. Porque se ele namora você e fica com dez outras garotas, ele decidiu faltar ao respeito com a relação que vocês construíram em prol de um prazer momentâneo de horas vagas. Se ela optou por sair com as amigas ao invés de jantar com você após a décima tentativa do mês, seja por cu doce ou por simples falta de vontade, ela escolheu correr o risco de não haver um próximo convite no fim de semana. Se ambos decidiram não ligar na noite posterior ao encontro, esperando um singelo movimento que fosse da parte do outro, os dois optaram pelo risco do interesse se perder em meio a um turbilhão de pensamentos desencontrados e equivocados sobre os momentos que passaram juntos. A similaridade entre todas estas situações é que todo mundo fez uma escolha, menos a real pessoa que deveria ter controle sobre seus desejos e vontades – ou seja, você mesmo.
No anseio por uma dica de qual caminho seguir, da direção do próximo passo, na boa e velha expectativa de correspondência, a gente espera. Espera porque acha que dessa vez é diferente, que tudo vai mudar, que uma boa noite de sono vai ser capaz de nos trazer uma resposta. Contrariamente ou não, a gente espera do outro um comportamento que só a gente é capaz de assumir. A gente espera que a indecisão do outro resolva a nossa vida. E aí não tem porre, melhor amigo, choro no travesseiro ou pote de sorvete que dê jeito no espinho que a gente mesmo plantou naquele jardim tão florido. Persistir em uma determinada travessia e sujeitar-se ao amor ou desamor que aquela encruzilhada impõe é, invariavelmente, estagnação e vontade nossa. Decidir quem você é e o que você quer para o resto da sua vida é o primeiro passo de um processo de transposição bem sucedido.
Escolher dói. Mas ficar em cima do muro pode machucar muito mais. No fim, se a gente não souber decidir por aquilo que é melhor para os nossos sonhos, nossos encantos e desencantos, nossa vida fica fundamentada na maioria das vezes na não tão boa vontade de alguém que cruzou nosso caminho por simples destino, acaso ou sorte. Aliás, sorte mesmo é ter alternativas e, melhor ainda, poder utilizar o bem mais poderoso que existe no universo em prol da nossa felicidade: o livre arbítrio.
Não adianta ter a faca e o queijo se faltar a fome. Gritar aos quatro cantos que busca a felicidade, um cantinho pra dormir, um par de pés pra descansar e outro pra viver por aí só é válido se esta eterna procura for feita de corpo, alma, coração e convicções, porque de gente perdida em cima do muro o “meio do caminho” tá cheio. Se deliciar com as oportunidades, se lambuzar com os acasos, degustar cada pontinha daquela adrenalina gostosa que bate no fundo do peito cada vez que a gente decide ir por ali ao invés de acolá. Toda vez que o amanhã trouxer de bandeja um menu de degustação novinho em folha, lembre-se de que cabe a você decidir a hora em que será servida a sobremesa. Porque não existe nada mais libertador na vida do que saber que a fome é sua e de mais ninguém.

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