segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Sobre o tempo...


Quando alguém fala que o tempo cura todos os males acho isso um pouco ingênuo. É como se o tempo existisse concretamente em nossas vidas e o passar dos ponteiros num relógio criasse uma mágica em nossa mente. 

O envelhecimento não cria pessoas necessariamente mais sábias, felizes, menos egoístas ou maldosas. A aparente sensação de fraqueza física não muda o caráter e a personalidade de ninguém. O que muda é a maneira que os conflitos se manifestam, canalhas também envelhecem. A diferença é que a fraqueza orgânica os impede de aplicar golpes tão engenhosos quanto na juventude.


O passar do tempo também não faz esquecer nada, apenas distrai a aparente sensação de proximidade de um estímulo que antes era recente. Não é do tempo do calendário que estou falando. Quando o tempo de fato “cura” alguma coisa o que as pessoas dizem sem o saber é que a perspectiva de algo mudou, ou seja, é a mente da pessoa que se reposicionou de tal forma que por uma nova atitude houve uma verdadeira reabilitação.

Então, o que muda com o passar das horas? Nada, se você assim deixar. Você pode piorar as coisas com o passar do tempo. Colocar mais caraminhola na sua cabeça, adotar visões radicais e deterministas das situações. Com o passar do tempo pode se endurecer ainda mais e afirmar coisas do tipo: “já vi muito nessa vida e não confio em mais ninguém”. Onde o tempo curou? Em nada, ele só deu mais chance da pessoa formular teorias distorcidas e criar mais mecanismos de defesa emocionais em torno de algo. A memória é fantástica exatamente porque registra o que nossa emoção elege deixar marcado. O passar das horas pode criar uma reafirmação infinita que torna algo crônico. O que cura é a mudança de perspectiva, o “eureca!” que pode acontecer em 1 minuto e em 30 anos. Para a mudança de perspectiva acontecer são necessárias posturas complementares: abertura, desprendimento e humildade.

Abertura para o novo. Isso pode acontecer com a perda das forças físicas com certeza, novos valores podem ser disponibilizados para uma pessoa. Pense num homem que depositava toda sua autoestima na capacidade sexual e se vê impotente por conta de um câncer ou diabetes. Ele pode simplesmente se fechar amargurado e cheio de revolta, mas também pode repensar sua vida e tentar descobrir que ele está além do seu pênis. Esse aprendizado estava disponível a ele na primeira broxada com 15 anos de idade. Não foi o tempo, foi sua resistência a olhar o obvio diante do nariz. Ele era muito prepotente para estar aberto, mas podia não estar, independente da idade.

Desprendimento de certezas absolutas e assuntos fechados associada à abertura produz os milagres que atribuímos ao tempo. O novo se abriu, mas se eu não me dispus a abandonar o velho continuará empacado, marcado pela ignorância e rebatendo qualquer ideia que venha abrir meus olhos para uma verdade inevitável: nada nos pertence em definitivo. As pessoas mudam, os desejos oscilam, as vontades se alternam, as coisas emboloram e a vida cessa. Nenhuma ideia pode resistir a isso, se apegar na permanência infinita de qualquer coisa é um fator causador de sofrimento. O sofrimento é sinal de apego à ideia de que nada pode perecer ou se afastar de nós, principalmente aquelas que elegemos como nossas favoritas.


Por ultimo é a humildade de reconhecer que as coisas são o que sao independentes de nosso controle que nos amplia os recursos do coração para aceitar aquilo que é doloroso aceitar. Você não é perfeito, as pessoas se enganam, se perdem, se iludem, se precipitam e tudo isso pode criar desconfortos que não tenham volta. Goste ou não terá que aceitar isso. É no centro de nossa vontade mais genuína de permitir que as coisas sigam em frente que algo realmente muda. Em essência é a postura de rendição à beleza da vida (as vezes amarga para o nosso ego mimado) que cura. Quem dera fosse o tempo, e todos esperaríamos no banco da praça para curar qualquer coisa...

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